A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL NO VALE DO ARARANGUÁ

MEMÓRIAS DE UM TEMPO DE REPRESSÃO E VIOLAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

Autores

  • Renan Borges Gonçalves
  • João Henrique Zanelatto

Resumo

O presente resumo busca refletir sobre a repressão e o tratamento destinado as minorias de descendência alemã e italiana chamadas “Súditos do Eixo” durante a fase ditatorial do governo Getúlio Vargas (1937-1945) na região do Vale do Araranguá, no contexto da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Nesse período, inúmeras práticas repressivas legitimadas pelo Estado brasileiro foram executadas. Com a política da nacionalização e a entrada do Brasil no conflito bélico contra os países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão), a partir de 1942, práticas culturais, políticas e econômicas vinculadas a alemães, italianos e japoneses e seus descendentes passaram a ser combatidas. Perseguições, apreensões, detenções, confinamentos foram práticas comuns sobre estes grupos naquele período por serem considerados “inimigos de guerra” e “perigosos à segurança nacional”. Naquele tempo de guerra, um dos mecanismos repressivos mais notórios utilizado pelo governo, foi a criação de campos de concentração/confinamento em vários locais espalhados pelo país. Esses locais tinham por finalidade confinar pessoas de origem estrangeira (alemães, italianos e japoneses) considerados inimigos do Brasil na guerra. Oficialmente, segundo Macedo (2007) em correspondências recebidas e expedidas pelo Ministério das Relações Exteriores (1942-1945), é possível constatar a presença de pelo menos quarenta locais de concentração/confinamento em todo o país, mas as evidências apontam para a existência de inúmeros outros locais “não oficiais”. No Estado de Santa Catarina, havia dois desses locais: um em Florianópolis e outro em Joinville. Extraoficialmente, conforme afirmado anteriormente, existiram vários outros locais para confinamento, como é o caso de Timbé do Sul, localizada aos pés da Serra Geral, na época um distrito do município de Araranguá, no extremo sul catarinense. Eram detidas pessoas de origem estrangeira, que tivessem envolvimento com atividades políticas ou qualquer outro tipo de atividade entendida como subversiva. Os locais onde ficavam confinados eram precários e pouco higiênicos e a alimentação era controlada e, por vezes, insuficiente; as correspondências eram censuradas, e foram libertados após o término do conflito mundial. Civis livres também sofreram abusos repressivos. Perazzo (2009), afirma que havia normas internacionais de proteção ao prisioneiro de guerra regulamentadas pelos acordos estabelecidos pela Convenção de Genebra de 1929. Assim, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha era a instituição responsável pela assistência aos confinados em campos de concentração/confinamento no Brasil, ou seja, faziam inspeções nesses referidos locais, percebendo as condições a qual se encontravam os detidos, responsáveis também pela transmissão de mensagens, correspondências aos familiares entre outras funções. Essas visitas e inspeções só ocorriam nos campos de concentração/confinamento considerados oficiais pelo governo brasileiro. Portanto, Timbé do Sul e inúmeros outros locais de concentração/confinamento, jamais tiveram qualquer tipo de fiscalização realizada por esses órgãos internacionais. Verificou-se ao longo da pesquisa, através de várias fontes (bibliográficas e orais) relatos que corroboram para o desrespeito à dignidade dos prisioneiros.  A própria Constituição brasileira de 1937, no Art. 168 legitimava as arbitrariedades do Estado. Seja como for, Timbé do Sul reservou nos tempos de guerra um capítulo peculiar em nossa história: uma história que permaneceu viva apenas nas memórias daqueles que a vivenciaram e, é na busca destas vozes silenciadas por décadas que se constituíram as páginas deste estudo. Portanto, é pertinente a execução de pesquisas referente aos campos de concentração brasileiros no período da Segunda Guerra Mundial, pois ainda proporcionam reflexões sobre essa prática de confinamento recorrente no século XX. Por ser um tema ainda foi pouco explorado pela historiografia, algumas indagações surgem: como a campanha de nacionalização e a 2ª Guerra Mundial afetaram o cotidiano de alemães e italianos e seus descendentes no sul de Santa Catarina? Como essas pessoas eram tratados pelas autoridades nesses locais enquanto permaneceram confinados? Qual é a retórica oficial utilizada pelo governo sobre este tratamento? Qual é a versão defendida por aqueles e aquelas que estiveram na mira da repressão e perseguições que resultavam em detenções? Por quais motivos Timbé do Sul teve um local de confinamento? A pesquisa teve como objetivo evidenciar as inúmeras formas repressão implementadas pelas autoridades sobre as populações de origem estrangeira (alemães e italianos) sobretudo, no Vale do Araranguá. Assim, a pesquisa visou compreender as relações entre as autoridades e os presos de Timbé do Sul, bem como analisar como essas relações influenciavam no modo como esses estrangeiros eram tratados nos locais por onde permaneciam confinados. Objetivou-se ainda destacar as tensões da política regional e local que perpassam a campanha de nacionalização. A linha metodológica adotada por esta pesquisa, abrange desde a análise de documentos primários (livros, relatórios, cartas, telegramas, comunicados, troca de correspondências entre autoridades), sejam elas oficiais ou não assim como produções acadêmicas; outra fonte essencial para esta pesquisa foram as fontes orais, adquiridas por meio de entrevistas. Consideramos uma lástima inexistirem ou praticamente inexistirem registros fotográficos ou escritos daquela época, e, é na busca destas vozes silenciadas por décadas que se constituíram as páginas deste estudo. Por fim, a pesquisa demonstrou que durante Segunda Guerra Mundial os Direitos Humanos não foram violados somente no campo de batalha, mas também as populações de pequenas comunidades que estavam muito longe do conflito, em especial os imigrantes alemães, italianos e seus descendentes no Vale do Araranguá.

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Publicado

2024-12-12