A VIOLAÇÃO AOS DIREITOS INDÍGENAS NO BRASIL
UM HISTÓRICO DE FALTA DE REPRESENTATIVIDADE E DESTRUIÇÃO DA SOCIODIVERSIDADE
Resumo
Esta pesquisa tem como objetivo analisar as violações aos direitos indígenas no Brasil e estudar a evolução global do reconhecimento dos direitos dos povos tradicionais diante da herança do colonialismo, especialmente no movimento do constitucionalismo pluralista em países latino-americanos como o Brasil, destacando a falta de representatividade dos povos indígenas como um importante obstáculo à efetividade de sua proteção. A análise parte da hipótese de que a falta de representatividade dessas populações nas esferas de poder do Estado agrava o cenário já existente de desrespeito aos direitos humanos, intensificado pelas invasões de garimpeiros, extrativistas e grileiros, além da já conhecida inércia governamental em coibir tais práticas. A presente pesquisa é documental e bibliográfica e o método adotado neste trabalho é o hipotético-dedutivo, analisando o problema à luz da hipótese apresentada por meio do estudo dos fatos históricos. Concluiu-se acerca da necessidade de se repensar tanto a efetividade dos dispositivos de proteção da Constituição de 1988 quanto o decisionismo judicial desprovido de uma análise ecológica do direito capaz de observar o entorno do sistema jurídico com maior profundidade, em prol da efetividade dos direitos fundamentais dos povos tradicionais. Estas comunidades não se veem representadas nas principais instituições do Estado, o que está diretamenterelacionado com a persistência das violações de seus direitos. A questão que persiste no entorno da problemática é a falta de representatividade nas estruturas do próprio Estado brasileiro, considerando que não há cotas de parlamentares indígenas no legislativo. Da mesma forma, a mais alta Corte do país, o Supremo Tribunal Federal, não possui sequer um Ministro oriundo de povos tradicionais. O Judiciário não tem como assumir sozinho o papel de sujeito emancipatório da sociedade porque sua estruturação atual ainda se dá através de representantes dos sujeitos hegemônicos consubstanciados em uma elite do funcionalismo público. A organização da sociedade atual, portanto, não permite que os sujeitos que poderiam assumir a diretriz emancipatória tomem as decisões sociais, mas somente abre espaço para que os sujeitos hegemônicos o façam (Carneiro, 2020). Isto fica evidente quando observamos que o Brasil estacionou desde 1988 no limiar do segundo ciclo do horizonte do constitucionalismo pluralista. A instrumentalização do texto constitucional, a qual se resume na garantia de raciocínios legais indutivos sobre a aplicação das leis ou no reconhecimento de direitos fundamentais reforçados semanticamente pelo Judiciário em meio a uma cegueira estratégica sobre o entorno, é fenômeno capaz de denunciar a necessidade de se promover uma observação ecológica de segunda ordem capaz de se atentar à normatividade e à atual instrumentalização do sistema em benefício de determinados grupos poderosos (Carneiro, 2020b, p. 31). Desta forma, considerando as formas não normativas de racionalidade e reprodução da sociedade, é preciso observar a relação do sistema jurídico com seu ambiente exterior mediante uma análise ecológica do direito capaz tanto de explicar quanto de contribuir com as pretensões às quais se propõe, estruturando-as no sistema jurídico (Carneiro, 2020a, p. 24). A análise ecológica proposta por Carneiro (2020) é uma observação sociológica jurídica de segunda ordem que se detém sobre a forma como o direito se comunica e produz autorreferência de si mesmo. Trata-se de uma proposta de ajuste às perspectivas críticas porque se preocupa com o sistema jurídico e o seu ambiente sem se limitar às diferenças internas do próprio sistema, mas sim incorporando a análise do ambiente. Isto ocorre mediante a observação do impacto dos programas normativos (ou da ausência destes) neste mesmo ambiente.
O problema passa a ser a ferramenta de observação, em razão de seu critério redutor da complexidade social, para a resolução de determina questão. O caráter crítico da análise ecológica do direito, então, é voltado para os efeitos latentes do sistema jurídico em sua dimensão simbólica diante da tentativa de resolução de determinada questão. Distancia-se, portanto, esta proposição teórica de um mero debate atinente à eficácia das normas jurídicas. Outro ponto a ser notado é que a proteção dos povos tradicionais é uma temática atinente à preservação da sociodiversidade. Para Manuela Cunha (1994, p. 134) as culturas constituem um patrimônio da diversidade humana, na acepção de apresentarem soluções organizacionais do pensamento e da exploração de um meio simultaneamente temporal, social e natural. Ora, a cultura se constitui como uma espécie de reserva de achados e possíveis pontos de partida para as futuras gerações. É um reservatório do qual poderão encontrar exemplos de processos e sínteses sociais já experimentados pela humanidade e cujo ponto de vista não é por si só evidente. Ora, nosso modelo de evolução também perpassa pelo estudo das perdas sociais, a ponto do desaparecimento de processos e linguagens poder ser comparado à extinção de variedades de espécies animais e vegetais. Manter em continuidade a sociodiversidade pressupõe manter a continuidade das sociedades que os produzem (Cunha, 1994, p.134-135). Assim, o desafio enfrentado por essas populações indígenas diz respeito à falta de autonomia, ausência de representação e impossibilidade de autogestão sem a intervenção conjunta estatal nas comunidades tradicionais. Além disso, também há aqui um alerta para a importância do Estado, com urgência, cumprir seu papel constitucional de forma efetiva e não meramente simbólica. É preciso, assim, que se concebam mecanismos contra-majoritários para se garantir a proteção e a representatividade dos povos indígenas. Importa reiterar que o Judiciário não tem como reunir as condições para ser o caminho emancipatório da sociedade se for o retrato de uma elite representante do poder hegemônico. A evolução das instituições tem sido evidente ao longo da história nacional, mas a falta de mecanismos democráticos fortalecedores, como a representatividade de membros de grupos minoritários no Legislativo ou na composição da cúpula do Judiciário nacional prejudica a evolução desta marcha. Conclui-se que é preciso, desta forma, repensar o atual modelo de justiça baseado em uma racionalidade cognitiva indutiva que não se atenta para o entorno não jurídico do sistema. A análise ecológica do direito surge como contraponto à cegueira jurídica institucional sobre seu entorno/ambiente como possibilidade de luta contra a herança colonialista de desigualdade e injustiça social.
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