DO DIREITO FUNDAMENTAL À DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO E O ACESSO À JUSTIÇA
UMA ANÁLISE DO CENÁRIO BRASILEIRO A PARTIR DO GARGALO DAS EXECUÇÕES FISCAIS
Resumo
A efetividade pode ser considerada como um fim primordial do processo. Não se concebe mais processo, na visão constitucional contemporânea, sem considerar a efetividade como uma garantia processual. E, dentro da efetividade, está o tempo. Em relação ao tempo, há aspectos filosóficos e sociológicos que precisam ser tomados em conta para que se compreenda, verdadeiramente, a sua dimensão social, a fim de que seja possível identificar os aspectos relevantes do direito fundamental à duração razoável do processo. Nesse sentido, a presente pesquisa tem como objetivo apurar a transformação do acesso à justiça em acesso à justiça efetiva, ou seja, a garantia de que todos possam não apenas acessar o sistema judicial, mas também obter resultados justos e equitativos em tempo hábil. A pesquisa examina a relação do tempo com a efetividade, considerando o tempo como um direito fundamental inserido no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal de 1988, e as resultantes consequências na ferramenta processual. Ao final, buscar-se-á averiguar, a partir dos números do Conselho Nacional de Justiça, qual o cenário da morosidade processual brasileira, especificamente no que diz respeito à tramitação das execuções fiscais na justiça federal. O objetivo é concluir se há uma relação de influência do processo com intempestividade processual e se a dissonância entre as espécies processuais gera uma oposição à unidade do direito no que concerne à duração razoável do processo e ao acesso efetivo à justiça.
Só existe acesso à justiça com efetividade. Não há como permitir que hoje se compreenda acesso à justiça como mero direito de peticionar. Na visão constitucionalista contemporânea, acesso à justiça se traduz em efetividade da prestação jurisdicional e na tarefa do processo tutelar os direitos materiais e tutela os próprios direitos processuais.
O tempo é um valor social e fundamental para a efetividade. Como reflexo das mudanças sociais, o processo deve garantir que o tempo dos envolvidos não seja desperdiçado, assegurando assim a efetividade processual. A certeza de que o tempo é precioso pode ser observada com o nascimento do direito fundamental à duração razoável do processo positivado por meio do inciso LXXVIII do art. 5º na nossa Constituição Federal. Em síntese, o tempo virou um direito fundamental.
Portanto, não será permitido que o processo dure por um tempo desproporcional ao que se entende razoável ou, ainda, não serão aceitas posturas que vão contra a tempestividade processual.
Por isso, se buscará no presente estudo percorrer o seguinte caminho especulativo, a partir do método bibliográfico: como objeto geral, em um primeiro momento, será demonstrado que o acesso à justiça em nossos tempos se resume, de regra, na efetividade da prestação jurisdicional, como objeto específico, será feita uma análise para relacionar o tempo com a efetividade processual. Por fim, também como objeto específico, será abordado em tópico específico o direito fundamental ao tempo traduzido no direito fundamental à duração razoável ao processo em cotejo aos números fornecidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em relação ao tempo de tramitação das execuções no âmbito da justiça federal para comparar com todo o estudo abstrato e doutrinário preliminarmente discorrido.
O caminho percorrido terá como fim responder se efetivamente, hoje, o processo produz ou influencia na morosidade presente no judiciário brasileiro e se alcança o acesso à justiça efetiva.
A efetividade no processo garante a sua missão institucional: assegurar e não violar direitos. Além de assegurar os direitos humanos, o processo precisa criar meios necessários e os fortalecer (MENEZES DIREITO, 1998).[1]
No ano de 2004 foi positivado a duração razoável do processo como direito fundamental por meio da Emenda Constitucional nº 45 de 2004. Inaugurando uma reforma no Poder Judiciário, a referida emenda buscava alterar o caráter moroso e burocrático da justiça brasileira a partir de técnicas que fossem capazes de acabar – ou ao menos diminuir – com os problemas estruturais que estavam na realidade forense brasileira[2]. Além das mencionadas alterações, o direito fundamental ao tempo foi inserido expressamente na CRFB/1988, no inciso LXXVIII ao artigo 5º com o seguinte teor: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”
Em 2016, o CNJ relatou que o tempo médio para uma sentença era de 5 anos e 3 meses, para baixa de 6 anos e 1 mês, e para processos pendentes de 7 anos e 9 meses. Em 2022, esses números aumentaram para 7 anos e 5 meses, 6 anos e 11 meses, e 8 anos e 10 meses, respectivamente. Em 2016, a média de 7 anos e 9 meses para uma execução já era considerada onerosa, especialmente em processos que requerem celeridade. O CNJ também destaca o "gargalo das execuções fiscais" como um problema histórico nos dados fornecidos.
As execuções fiscais representam 65% das execuções pendentes em todo o Judiciário e, na Justiça Federal, representam 45% do acervo. No ano de 2021, a cada 100 execuções, apenas 10 foram baixadas. O tempo médio de tramitação até a baixa de uma execução fiscal nos Tribunais Regionais Federais é de 9 anos e 11 meses.
Ou seja, o que se apura é que há uma certa dissonância da realidade entre os tipos de processos e as respectivas durações. A depender da relação, há óbices, que merecem atenção, que tornam aquele processo moroso e burocrático. Por tal razão, há uma diminuição na eficácia do direito fundamental estampado no inciso LXXVIII ao artigo 5º da CRFB/1988.
O estudo iniciou com a análise do acesso à justiça efetiva, destacando o tempo como requisito essencial. Em seguida, foi apresentado o direito fundamental à duração razoável do processo, conforme o inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição. Também foram discutidos dados do CNJ sobre a tramitação de processos, especialmente execuções fiscais na justiça federal. A análise sugere que a solução ou origem da morosidade no judiciário brasileiro pode não ser puramente processual.
Ao contrário, ao ler o processo por meio da visão constitucional contemporânea, não se permite ou se justificam tutelas intempestivas, sendo dever do juiz e das partes promoverem dentro do rito comportamentos adequados.
A tarefa do processualista moderno é “expor o impacto substantivo dos vários mecanismos de processamento de litígios” para além do campo dos tribunais, mas somando o estudo com a sociologia, psicologia e política (CAPELLETTI, 1988). Quando a justiça não é feita dentro de um prazo razoável, torna-se uma justiça inacessível (CAPELLETTI, 1988).
Neste caso, independente daquele que tem razão, todos acabam perdendo. Em vistas às causas complexas da morosidade das execuções fiscais que envolvem aspectos políticos, tanto nas opções legislativas quanto interpretações judiciais, é “ambição vã querer encontrar no puro receituário processual remédio definitivo para a enfermidade” (BARBOSA MOREIRA, 1983).
Torna-se necessário, portanto, uma visão para além do processo civil a fim de garantir uma unidade no direito especificamente quanto ao tempo de duração do processo, a fim de evitar dissonâncias temporais e efetivas entre as espécies processuais.
[1] Inclusive, Na década de 80, o ilustre professor José Carlos Barbosa Moreira elencou quatro requisitos a serem satisfeitos pelo processo a fim de assegurar a efetividade: i) instrumentos de tutela adequados; ii) instrumentos a todos titulares de direitos; iii) condições próprias à exata e completa reconstituição dos fatos; iv) resultado que garanta o gozo pleno da tutela e v) mínimo dispêndio de tempo e energia (BARBOSA MOREIRA, 1983).
[2] O ilustre doutrinador Humberto Theodoro, à época da referida emenda, destacou que se almejava a aproximação com o ideal do processo justo (THEODORO JÚNIOR, 2004).
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