O ACESSO À JUSTIÇA DOS EMPREGADOS DOMÉSTICOS EM CONDIÇÃO ANÁLOGA À ESCRAVIDÃO
Resumo
Em 13 de maio de 1888, a Princesa Regente Isabel, em nome do Imperador D. Pedro I, sancionou a Lei Áurea, por meio da qual foi declarada extinta a escravidão no Brasil. Somente em 2003, a Lei nº 10.803 inseriu ao Código Penal Brasileiro o artigo 149, o qual tipificou como crime a redução a condição análoga à de escravo. O tipo penal em questão ocorre quando uma pessoa é submetida a trabalhos forçados ou jornada exaustiva, ou a condições degradantes de trabalho, por meio do cerceamento de sua liberdade. Em 2015, foi promulgada a Lei Complementar nº 150, a qual equiparou os empregados domésticos aos demais trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), representando inequívoca conquista para o ordenamento jurídico brasileiro. Em contrapartida, segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) divulgados em maio de 2024, equipes de fiscalização resgataram 119 empregados domésticos em regime de escravidão no Brasil. Ainda, em abril de 2024, o MTE publicou o Cadastro Atualizado de Empregadores que submeteram trabalhadores a condições análogas à escravidão, vide Portaria Interministerial MTE/MDHC nº 15 de 26/07/2024. Popularmente conhecido como “Lista Suja”, o referido cadastro adicionou 248 empregadores à lista anterior, dos quais, 43 mantinham empregados domésticos como escravos. Não obstante os marcos históricos, jurídicos e legais, é evidente que os dispositivos legais supracitados não representaram a efetiva abolição de todas as formas de opressão e o fim dos trabalhos forçados e degradantes no país, sendo indiscutível, portanto, a persistência do trabalho doméstico análogo à escravidão no Brasil hodierno. Dentre os casos recentes, destaca-se o de Madalena Gordiano, mulher negra e analfabeta que, em 2020, foi resgatada após quase quatro décadas trabalhando como escrava para um casal em Patos de Minas (MG). O patrão, Dalton Rigueira, então professor universitário, negou direitos à Madalena, como liberdade, o direito à educação, além de nunca lhe ter pago salário ou qualquer outra verba trabalhista. Sob o mesmo viés, em 2022, a Folha de São Paulo, em colaboração com o jornalista Chico Felitti, lançou “A Mulher da Casa Abandonada”, um podcast investigativo que relembra o caso envolvendo Margarida Bonetti, brasileira foragida do FBI por manter uma empregada doméstica em condições análogas à escravidão por quase duas décadas. Desde os 19 anos de idade, Hilda Rosa dos Santos trabalhou para os pais de Margarida, membros da elite paulistana. Quando souberam que a filha e o marido, Renê Bonetti, mudariam para os Estados Unidos, insistiram que o casal levasse a empregada. Durante os anos que viveu em solo norte-americano, Hilda, que era analfabeta, dormia no porão da casa – que não tinha janelas e nem banheiro –, trabalhava mais de 12 horas seguidas diariamente, era agredida física e verbalmente por Margarida, e nunca recebeu salário. Em 2000, Renê Bonetti, que defendia que a empregada era “da família”, foi condenado à prisão, por mantê-la em condições análogas à escravidão, bem como ao pagamento de todos os salários não pagos, enquanto Margarida fugiu para o Brasil anos antes do julgamento. Evidentemente, o trabalho doméstico análogo ao escravo tem sua recorrência na contemporaneidade brasileira. Entretanto, o acesso à justiça para os empregados que se encontram em tal situação enfrenta obstáculos e se mostra dificultoso, sendo este, portanto, o objeto de discussão do presente resumo expandido. Sob esse viés, percebe-se que diversas vítimas se encontram em situações de extrema vulnerabilidade, tanto social quanto econômica, e, também, desconhecem seus direitos assegurados pelo ordenamento jurídico brasileiro, além de receberem, em alguns casos, reiteradas ameaças de seus patrões caso os denunciem. Consequentemente, tais fatores facilitam a exploração por parte dos empregadores, bem como dificultam a identificação e denúncia dos abusos. Desse modo, o presente resumo se justifica em virtude da necessidade de fortificação das políticas públicas de acolhimento para os empregados domésticos reduzidos a condição de escravos, garantindo a efetivação de direitos constitucionalmente tutelados, como a dignidade da pessoa humana, corolário da República Federativa do Brasil. Para sua elaboração, utilizou-se de pesquisa bibliográfica e exploratória, observando-se a temática teorizada com a descrição das características do assunto abordado, e análise de casos. Além disso, fez-se uso da abordagem quali-quantitativa, com o intuito de interpretar o crime previsto no artigo 149 do Código Penal Brasileiro, praticado em desfavor de empregados domésticos, bem como as temáticas que o permeiam. Portanto, com os resultados obtidos do presente resumo, pretende-se contribuir para o aprimoramento de políticas públicas que auxiliem o acesso à justiça aos empregados domésticos em condições análogas à escravidão no Brasil. O resumo é resultado das pesquisas feitas junto ao Grupo de Pesquisa/CNPq "Acesso à Justiça: Prevenção, Negociação e Resolução de Conflitos", mais especificamente à linha de pesquisa "Acesso à Justiça e Soluções Adequadas de Prevenção e Resolução de Disputas: Diálogo, Tecnologias e Garantia de Direitos".
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