DIREITO HUMANOS E DESASTRES AMBIENTAIS
A IMPORTÂNCIA DOS ABRIGOS EXCLUSIVOS PARA MULHERES E CRIANÇAS NAS ENCHENTES DO RIO GRANDE DO SUL EM 2024
Resumo
De acordo com Fraser “A mudança climática que agora ameaça o planeta é resultado direto da ação histórica do capital de recorrer à energia fossilizada a fim de abastecer as fábricas de produção industrial em massa.” (2019, p. 83). Um exemplo recente dessa crise ecológica ocorreu em maio de 2024, quando fortes chuvas e inundações assolaram o Rio Grande do Sul. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea, 2024), esse evento climático extremo afetou mais de 400 municípios gaúchos, impactando diretamente residências de mais de 876 mil pessoas. Nesse sentido, foi necessária a construção de abrigos temporários em diversas localidades para garantir os direitos humanos das pessoas atingidas pelo desastre. Esses abrigos foram essenciais para oferecer dignidade e segurança às pessoas afetadas. Entre esses abrigos, estão aqueles exclusivos para o atendimento de mulheres e crianças vítimas das enchentes (Peixoto, 2024). A partir desses fatos surgiu a ideia de produção desta pesquisa, cujo objetivo geral é compreender o tema relativo aos direitos humanos de pessoas em situação de desastres ambientais e os motivos pelos quais foi necessária a construção de abrigos exclusivos para o atendimento de mulheres e crianças no período das enchentes que afetaram o Rio Grande do Sul em maio de 2024. Na esteira dos objetivos específicos, se buscará apresentar um panorama dos direitos humanos, a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos, e demonstrar a importância dos abrigos exclusivos para combater a violência contra mulheres e crianças no cenário de calamidade ambiental. Por conseguinte, partiu-se da hipótese que foram construídos abrigos exclusivos para mulheres e crianças no período das enchentes que afetaram o Rio Grande do Sul para proteger essas pessoas de violências, tendo em vista que são grupos vulneráveis. Metodologicamente a pesquisa foi realizada através da técnica de abordagem hipotético-dedutivo, numa pesquisa de cunho qualitativo. Foram utilizados como procedimentos técnicos o levantamento bibliográfico e documental sobre Direitos Humanos de mulheres e crianças em situação de riscos e desastres. A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) de 1948, ventilou argumentos universalizantes sobre direitos humanos e tornou-se referência para o assegurar o tratamento humano e sua integridade em diferentes situações (Bruschini, Undehaum, 2002). O resultado da aplicação deste novo modelo cunhou um "novo ethos para sustentação da vida em sociedade [...] o resultado de uma necessidade de humanização da vida social, cujas dimensões extrapolam as necessidades de reparação das afrontas do passado" (Bruschini, Undehaum, 2002, p. 108). Bobbio (1992), acrescentou que esta declaração, embora não seja um sistema jurídico de normas, não deixa de ser um regramento a ser seguido, seja por seu cunho de natureza moral, seja pela historicidade que a inspirou. No cenário nacional, a DUDH influenciou fortemente o texto constitucional de 1988, isto se evidência quando se lê que um dos princípios da República Federativa do Brasil é a dignidade da pessoa humana (Brasil, 1988). Assim sendo, a aplicação jurisdicional brasileira, pauta-se sob a égide principiológica[1] da dignidade e da valorização dos direitos humanos, assim sendo, a humanização deve recair sobre todas as formas de expressão do Estado frente às adversidades da modernidade. Ao passo que o Estado brasileiro tem este direcionamento imposto por sua carta maior, a crise ecológica contemporânea se intensifica, gerando um cenário propício para a violação dos direitos humanos das populações afetadas por desastres ambientais. Para Fraser (2019), esta urgência global se vincula ao capitalismo, entretanto, a autora acrescenta um novo olhar sob esta perspectiva ambiental informando que a dinâmica climática não resulta somente na deterioração ambiental, mas também nas relações sociais, especificamente, a desigualdade de gênero, que exacerba a vulnerabilidade de mulheres, crianças e adolescentes. Dados da United Nations Population Fund (2016) mostram que, das mais de 125 milhões de pessoas que necessitam de assistência humanitária, mais de 75% são mulheres e crianças. Segundo o Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para a Infância, (United, Nations International Children’s Emergency Fund, 2024), crianças e adolescentes são os que mais sofrem com o deslocamento forçado, ficando expostos a doenças e diversas formas de violência. Esses dados reforçam que em situações de emergências humanitárias[2], mulheres, crianças e adolescentes estão entre os grupos mais vulneráveis, sendo expostos a riscos elevados de violência e violações de seus direitos humanos. A intersecção entre as crises ecológicas e humanitárias e a opressão de gênero é, portanto, um reflexo das profundas desigualdades que permeiam o sistema capitalista, o qual não só explora os recursos naturais, mas também reforça a exploração e marginalização das mulheres e de crianças, especialmente em contextos de crise. Nessa esteira, rememora-se a Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher, sobretudo os artigos 15 e 16, que estabelecem a igualdade de direitos entre homens e mulheres, argumento que se integra ao direito nacional, a partir do Decreto n. 4.377. Nesse contexto, tendo em vista o impacto diferenciado sobre mulheres, crianças e adolescentes em situações de emergência humanitária, é importante dar visibilidade à construção de abrigos temporários para atendimento exclusivo dessas pessoas, prática adotada diante da situação de emergência e com o objetivo de proteger essas pessoas de situações de violências. Essa medida foi implementada após denúncias de abuso sexual em abrigos na região de Porto Alegre, capital do estado (Teixeira, 2024). Além disso, mulheres expressavam desconforto e insegurança ao usar os banheiros e até mesmo para dormir, temendo que seus filhos fossem alvo de violência (Canofre, 2024). Diante disso, foi observada a importância de se construir abrigos exclusivamente para o atendimento de mulheres e seus filhos. Segundo a defensora pública Paula Simões Dutra de Oliveira, mulheres e crianças são grupos vulneráveis que ficam expostos a situações de violência quando abrigados em ambientes improvisados e coletivos (Peixoto, 2024). Fernanda Mendes Ribeiro, coordenadora de políticas públicas para mulheres de Porto Alegre, acrescenta que esses espaços garantem privacidade às mulheres, sejam elas mães solo ou sem filhos, além de assegurar a integridade física dessas pessoas (Teixeira, 2024). Portanto, a construção de abrigos exclusivos para mulheres e crianças em situações de desastre, como ocorreu no Rio Grande do Sul, é uma medida crucial para maximizar a segurança das pessoas desabrigadas e garantir a proteção de seus direitos humanos. Ao reconhecer e abordar as necessidades específicas de mulheres e crianças em contextos de emergência, o poder público e as organizações humanitárias cumprem o papel fundamental na defesa da dignidade humana e na garantia e promoção dos direitos humanos.
[1] Para Dantas, princípios são categorias lógicas e universais que quando incorporadas no ordenamento jurídico constitucional "refletem a própria estrutura ideológica do Estado, como tal, representativa dos valores consagrados por uma determinada sociedade" (1995, p. 59).
[2] Segundo Fink (2011), emergência humitária relaciona-se com alguma crise interna (seja de natureza política, social ou ecológica), resultando em um esgotamento dos meios de solução e/ou auxílio interna para a resolução do conflito ou desastre, desta feita, afetando o bem-estar, o direito das pessoas que ali se encontram.
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