ANÁLISE DA EFETIVIDADE DA RESSOCIALIZAÇÃO PENAL A PARTIR DA TEORIA DA ECONOMIA POLÍTICA DA PENA

Autores

  • Anne Izabel Ferreira Cavalcante
  • Tálisson Roberto da Silva Gonçalves
  • Bruno Moraes Arraes Sampaio

Resumo

O aumento da população prisional é um fenômeno conhecido na criminologia como "encarceramento em massa". Esse fenômeno tem gerado estudos em diversos campos científicos, que são essenciais para incentivar o poder público a implementar novas políticas públicas. De acordo com o Relatório de Informações Penais, elaborado semestralmente pela Secretaria Nacional de Políticas Penais – SENAPPEN (2022), no último ano, a população carcerária do Brasil cresceu desproporcionalmente em relação à sua população. No ano de 2016, havia 722.120 presos; em 2022, esse número passou para 832.295. A taxa de aprisionamento, referente ao número de reeducandos por cada 100 mil habitantes, era de 61 em 1990, 350,4 em 2016, e aumentou para 390,17 em 2022. Ao observar os dados, surge a necessidade de refletir acerca da efetividade do caráter ressocializador da pena, isto é, da produção de efeitos reais que a ressocialização propõe. Tendo em vista que o Estado, exercendo o seu poder de punir, deve garantir meios propícios à ressocialização do apenado, evitando a reincidência e a ocupação de novas vagas nas unidades prisionais. Assim, faz-se necessário perguntar: Como a Teoria da Economia Política da Pena pode ser aplicada para analisar a efetividade das penas privativas de liberdade no Brasil em termos de seu caráter ressocializador? Apesar da existência de mecanismos que auxiliem nesse processo, como a Lei de Execução Penal, há diversos fatores que influenciam na dificuldade de diminuir a população carcerária, como prisões mal estruturadas, sem condições mínimas de higiene e saúde, ações de grupos criminosos, e a falta de acesso à educação, ao trabalho e atividades capazes de preparar os apenados para a volta à sociedade (MARCÃO, 2015). Ademais, percebe-se que a sociedade prefere encarcerar em vez de abordar questões raciais, de gênero, sociais, políticas e econômicas subjacentes ao problema. Esse tensionamento se intensifica quando se trata dos direitos humanos dos presos, destacando a seletividade racial, de gênero e de classe do sistema de justiça penal, que é erroneamente visto como imparcial, igualitário e necessário para a proteção de todos (GONÇALVES, 2020). O objetivo geral é analisar a efetividade do caráter ressocializador das penas privativas de liberdade no Brasil, partindo da observação da Teoria da Economia Política da Pena de Alessandro de Giorgi. Os objetivos específicos são descrever os principais conceitos e fundamentos da Teoria da Economia Política da Pena e do fenômeno do encarceramento em massa; analisar como a EPP relaciona o sistema penal com a estrutura econômica e social; e analisar dados sobre a reincidência e reabilitação dos presos no Brasil, comparando os índices com a finalidade ressocializadora da pena. Trata-se de pesquisa qualitativa, com foco em explorar teorias, conceitos e interpretações sobre a ressocialização penal, ao invés de medir variáveis ou analisar dados numéricos. A pesquisa é qualitativa, bibliográfica e básica, pois é a adequada para aprofundar a compreensão de fenômenos sociais complexos e suas interpretações, amparada em revisão bibliográfica acerca do tema; seleção de artigos, livros e teses que discutem a aplicação dessa teoria em diferentes contextos, com foco na ressocialização e no sistema penal (GIL, 2002). Utilizou-se os termos “economia política da pena”, “encarceramento em massa” e “ressocialização penal” no Google Acadêmico, Scielo, Banco de Dados de Teses e Dissertações (BDTD). A teoria da Economia Política da Pena (EPP) baseia-se na relação entre os sistemas penais e a estrutura econômica e social, assim como na interação desses sistemas com as classes dominantes e as formas de organização laboral das sociedades capitalistas. Nos anos 1960, a EPP ganhou força ao expandir o campo da criminologia, incorporando críticas sobre a pena e os mecanismos de punição (DE GIORGI, 2017). Um dos seus fundamentos é analisar o sistema prisional como um mecanismo de controle capitalista que mantém as classes dominantes no poder e os despossuídos em exploração. Apesar das críticas, a EPP oferece contribuições importantes para a criminologia e o Direito penal, ampliando o estudo das periferias do capitalismo (SANTO, 2022). O encarceramento em massa ocorre quando a capacidade dos presídios é ultrapassada, resultando em superlotação e condições desumanas. Conforme Nucci (2024), essa superlotação transforma as celas em depósitos insalubres, comprometendo a integridade física e moral dos apenados. Isso infringe o art. 5° da Constituição Federal, que assegura o cumprimento de pena em condições específicas e o respeito à integridade dos presos (BRASIL, 1988). A falta de vagas impede a separação adequada dos apenados, levando à convivência de presos perigosos com aqueles sem indícios de violência, agravando a situação prisional. A partir dessa desproporcionalidade, a formação de grupos criminosos e facções dentro dos presídios brasileiros intensifica ainda mais o colapso do sistema prisional (GONÇALVES, 2021). Evidentemente, há negligência governamental em garantir os direitos fundamentais aos presos, assim como em fornecer uma estrutura carcerária adequada, falhando em cumprir o objetivo da legislação penal de reeducar e reintegrar o indivíduo ao corpo social. Logo, segundo a visão de Giorgi, a transformação das celas em depósitos, a “multidão” que é formada, corresponde ao controle do excesso da força de trabalho – aquilo que deve ser controlado através do Estado penal -, assim como à redução dos direitos das famílias pobres e dos desempregados (PIMENTEL, 2023). Destarte, para entendermos a relação entre o sistema prisional e a estrutura econômica e social, precisamos falar sobre a transição do Estado social para o Estado penal, ou seja, o momento em que o sistema penal abandona os princípios do Estado Democrático de Direito, e passa a criar mecanismos para punir os despossuídos, aqueles que estão à margem da sociedade, lidando diariamente com a exploração laboral. Segundo Pimentel e Araújo (2024), o Estado penal emerge como resposta do neoliberalismo em crises sociais e econômicas, usando o direito penal para punir os marginalizados e retomar o controle social. Isso integra o estudo da EPP, mostrando sua conexão com o encarceramento em massa e a violação do princípio ressocializador da pena. O Departamento Penitenciário Nacional (2022) relata que a reincidência criminal no Brasil chega a 39,9% em cinco anos, com crimes de drogas, roubo e furto refletindo a precariedade socioeconômica e a omissão estatal na reintegração dos presos. O encarceramento em massa no Brasil destaca a falha das políticas de ressocialização e controle da reincidência. A Teoria da Economia Política da Pena de De Giorgi (2006) evidencia que o sistema penal brasileiro serve para controlar as classes desfavorecidas, com prisões insalubres que não ressocializam e fomentam a violência. A superlotação, fruto de políticas punitivistas e falta de investimento em educação e saúde, mostra a negligência governamental em garantir direitos fundamentais, intensificando a marginalização em tempos de crise econômica e social. Os dados de reincidência criminal apresentados pelo Departamento Penitenciário Nacional indicam que, sem a garantia de uma reintegração digna, os apenados tendem a retornar ao crime, perpetuando um ciclo de violência e exclusão social. Portanto, é imprescindível uma reformulação das políticas públicas, priorizando a ressocialização efetiva e o respeito aos direitos humanos, visando à construção de uma sociedade mais justa e inclusiva.

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Publicado

2024-12-12