CONFIGURAÇÃO DO ADICIONAL NOTURNO NO TELETRABALHO E A PRESUNÇÃO IURIS TANTUM DO ART. 62, III, DA CLT
Resumo
Este estudo trata-se de uma pesquisa bibliográfica de método dedutivo, que visa verificar a possibilidade de configuração do adicional noturno no teletrabalho, a luz da CLT, e da CRFB/88 e da doutrina justrabalhista. Neste sentido, a presente pesquisa visa responder ao seguinte questionamento: como base a presunção iuris tantum prevista no art. 62, III, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de que forma pode ser compreendida a configuração do adicional noturno nos casos de telettabalho? Portanto, o presente estudo tem como objetivo geral: analisar a configuração do adicional noturno no teletrabalho à luz da presunção iuris tantum prevista no art. 62, III, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), identificando os desafios e implicações jurídicas para trabalhadores e empregadores. A fim de alcançar o objetivo proposto adotou-se 2 (dois) objetivos específicos: Investigar a presunção iuris tantum do art. 62, III, da CLT e sua aplicabilidade ao teletrabalho; analisar como o adicional noturno é aplicado no teletrabalho.
Diante de tais apontamentos, inicia-se dizendo que o teletrabalho é caracterizado pela realização de atividades laborais fora das dependências do empregador, utilizando tecnologias de informação e telecomunicação para comunicação entre empregador e trabalhador (Andrade, 2007). O trabalho noturno, definido como aquele realizado entre 22h00 e 05h00, possui remuneração superior ao trabalho diurno, conforme estabelecido no art. 73, §2º da CLT, sendo um direito fundamental trabalhista (Brasil, 2023a). As jornadas de trabalho podem ser classificadas em controladas e não controladas. Na jornada controlada, o empregador supervisiona e comanda as funções do trabalhador. Em contrapartida, na jornada não controlada, não há supervisão ou controle de horários pelo empregador (Delgado, 2019). As jornadas controladas refletem o poder de direção do empregador, conforme o art. 2º da CLT, que estabelece a necessidade de comando pessoal na prestação de serviços (Brasil, 2023a; Cavalcante; Neto, 2019b).
É importante destacar que esse poder não ilimitado, isto é, em outras palavras, esse poder precisa respeitar toda ordem que emanar da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/88), da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de leis específicas voltadas à matéria trabalhista, normas coletivas de trabalho, e principalmente da boa-fé (Martins, 2009). Uma questão importante pode ser levantada, há que se dizer que é fácil enxergar o controle do empregador sob o empregado em circunstâncias de trabalho presencial como por exemplo, cobranças de peças e tarefas terminadas, prestação de contas, horários fixados, revista com pudor dos trabalhadores na entrada e saída do estabelecimento empresarial (Cavalcante; Neto, 2019b), todavia, como vê-lo no teletrabalho?
O teletrabalho, já começa a ser delineado pela redação do art. 6º, § único, da CLT, que dispõe sobre a equiparação dos meios telemáticos de comunicação e informação ao meio presencial/pessoal de comando, controle e supervisão (Brasil, 2023a), ou seja, a tecnologia é a ferramenta que possibilita o exercício desse poder do empregador (Saad, 2016). Traduzindo para a linguagem prática, ainda se desconfia quanto a eficácia do controle através dos meios telemáticos no teletrabalho, mesmo que a norma já tenha admitido a possibilidade dessa ocorrência. Sanando esta dúvida que circula entre norma e realidade, é possível observar que com a ligação entre computadores (internet) é possível, por exemplo, fazer-se controle de produção por toques no teclado, observar entrada e saída de dados por registros feitos pelos computadores, horários registrados, entre infindáveis outras possibilidades (Martins, 2009). É importante destacar que a tecnologia atual permite que o teletrabalhador permaneça conectado após o término da jornada, tornando infundada a alegação de que não é possível controlar o trabalho remoto além disso, a CLT permite o controle por tarefas ou produções, reforçando essa possibilidade (Lima; Melo, 2018). O direito do trabalho é um direito fundamental, conforme o capítulo II do título II da CF/88, incluindo o artigo 6º e detalhado nos artigos 7º ao 11 (Brasil, 2023b). Os direitos fundamentais são invioláveis, indisponíveis e irrenunciáveis, e não podem ser afastados por exigência de uma das partes da relação trabalhista (Cavalcante; Neto, 2019b). A dignidade humana, fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, III e IV), deve ser respeitada em todas as normas trabalhistas, promovendo os valores sociais do trabalho, bem como, a jornada de trabalho noturna, conforme o art. 73, §2º, da CLT, ocorre das 22h às 5h do dia seguinte (Brasil, 2023a; Romar, 2019).
O trabalho noturno contraria o ritmo biológico natural, exigindo maior esforço do trabalhador e podendo impactar negativamente sua saúde e convívio social (Martins, 2009; Romar, 2018). Reconhecendo essa penosidade, a Constituição Federal de 1988, no artigo 7º, IX, estabelece que a remuneração do trabalho noturno deve ser superior à do diurno e o artigo 73 da CLT completa prevendo que esse adicional noturno de ser de no mínimo 20% sobre a hora diurna (Brasil, 2023a; Brasil, 2023b). O artigo 6º da CLT garante que, se comprovada a relação de emprego no teletrabalho, este deve ser equiparado ao regime presencial, assegurando todos os direitos trabalhistas (Andrade, 2007). No entanto, o artigo 62, III, da CLT, exclui o teletrabalhador do controle de jornada, aplicando-se apenas em casos de serviços por produção ou tarefas. Essa exclusão pode ser revertida se houver prova de controle efetivo, aplicando-se então as regras de duração do trabalho, incluindo o adicional noturno (Delgado, 2019). A realidade, no entanto, pode diferir da presunção legal, e nessas situações, entende-se que o princípio da primazia da realidade deve ser invocado para garantir os direitos do trabalhador, analisando-se a situação sob a perspectiva do controle concomitante.
Em outras palavras, é essencial considerar o fato real, afastando a norma se necessário (Pretti, 2018). O art. 9º da CLT estabelece que atos que desvirtuem a aplicação dos preceitos da Consolidação serão nulos, reforçando a primazia da realidade (Brasil, 2023a). Assim, o estudo mostra que é possível controlar o teletrabalhador em tempo real ou por metas de produção e que normas sobre jornada de trabalho, como o adicional noturno, não podem ser afastadas no teletrabalho quando há controle da jornada. Portanto, o art. 62, III, da CLT deve ser afastado quando há controle da jornada, aplicando-se o princípio da primazia da realidade (Teixeira; Serpa, 2019). Meios telemáticos de comunicação são eficazes no controle e supervisão, muitas vezes mais incisivos que o controle pessoal do empregador, como é o cado do "controle duplo" ou "combo", que combina controle por jornada e produção/tarefa (Dallegrave, 2014). O empregador consegue saber através das atividades e da produtividade no telelabor o tempo utilizado pelo trabalhador, nem preciso é uma tecnologia para medir esse tempo, pois todo afazer tem um período mínimo para ser feito, e os autores destacam que o empregador é ciente desta realidade (Deste; Pacheco, 2021, p. 76). Portanto, seja por tecnologia, seja por conhecimento comum do tempo mínimo para cumprir determinada demanda, qualquer trabalho pode ser controlado, assim a inserção do teletrabalho no art. 62, III, da CLT é uma afronta ao mundo real e ao teletrabalhador.
O art. 7º, XIII, da CRFB/88, aduz que a jornada de trabalho é de 8 horas diárias e 44 horas semanais. Como compreende-se pelo presente estudo, o controle dessa jornada em telelabor é possível, neste sentido, o direito à remuneração excedente e demais direitos decorrentes desse controle de jornada de trabalho, como por exemplo, o adicional noturno, que só pode ser auferido se verificado o labor noturno, são devidos ao teletrabalhador, é incompatível a inserção no art. 62, III, da CLT (Souza, 2019). Todavia, não é possível excluir a possibilidade de prova a favor do não controle, já que a presunção é iuris tantum, relativa, se constata-se que não existiu controle de jornada, a aplicação do artigo 62, III, da CLT passa a vigorar novamente, mas veja-se só, é sob a égide do princípio da primazia da realidade (Teixeira; Serpa, 2019). Em conclusão, a aplicação ‘seca’ da Lei. n. 14.442/2022, do art. 62, III da CLT, é errônea, uma vez que conflita com o princípio da primazia da realidade, que torna a exclusão da norma de caráter relativo e contornável.
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