DIREITO SOCIAL AO TRANSPORTE

DESAFIOS ENFRENTADOS PELOS USUÁRIOS DO TERMINAL RODOVIÁRIO DO GUAMÁ NA CIDADE DE BELÉM/PA

Autores

  • Ana Manoela Piedade Pinheiro

Resumo

O tema do estudo consistiu no direito social ao transporte, com foco nos desafios enfrentados pelos usuários do Terminal Rodoviário do Guamá (TRG), localizado no bairro do Guamá, na cidade de Belém, estado do Pará, relacionados ao exercício desse direito e ao direito à cidade. O problema buscou responder quais são os desafios enfrentados pelos usuários de ônibus no TRG, no que se refere aos seus direitos humanos ao transporte e à cidade. O objetivo geral da pesquisa se pautou em identificar os desafios enfrentados pelos usuários de ônibus no TRG, considerando o direito social ao transporte e à cidade, ambos associados à mobilidade urbana. Os objetivos específicos consistiram em relacionar o direito ao transporte ao direito à cidade, alinhados à mobilidade urbana; demonstrar as bases legais que fundamentam a discussão; expor a aproximação das teorias de Harvey e Kowarick na análise dos desafios identificados. Para tanto, realizou-se pesquisa documental com base na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988), no Estatuto da Cidade, na Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU) e na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável; assim como, pesquisa bibliográfica com o uso de artigos de periódicos científicos e livros; além da pesquisa de campo, com observação direta e investigativa – ocorrida em duas semanas, dos dias 29 de julho a 02 de agosto de 2024 e 05 de agosto a 09 de agosto de 2024 – no TRG, no horário de 18h às 19h, a fim de identificar quais seriam os desafios enfrentados pelos usuários do transporte público coletivo por ônibus neste terminal. Desse modo, o estudo gerou dados primários, bem como se utilizou de dados secundários. Conforme Barroso (2022), a CRFB/1988 traz em sua redação um rol de direitos humanos e em decorrência de estarem previstos constitucionalmente na Carta Maior os tornaria direitos fundamentais. Assim, no título dos direitos e garantias fundamentais, encontra-se o direito social ao transporte, previsto no artigo 6º, caput da CRFB/1988, tendo sido incluído somente no ano de 2015 mediante a Emenda Constitucional n. 90 (Brasil, 1988). Associado, ainda, à própria dignidade da pessoa constante como fundamento da República Brasileira no artigo 1º, inciso III da CRFB/1988 (Brasil, 1988). Desse modo, o direito ao transporte se faz presente igualmente no Estatuto da Cidade – lei federal do ordenamento jurídico brasileiro – no artigo 2º, inciso I, no que refere à garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como sendo um conjunto de direitos, no qual se inclui o direito ao transporte (Brasil, 2001). Associado a ambas, nessa construção das bases legais, tem-se a Lei Federal n. 12.587 de 2012, que institui a PNMU e consiste em um instrumento da política de desenvolvimento urbano derivada do artigo 182 da CRFB/1988 (Brasil, 2012; Brasil, 1988). Observa-se que a PNMU tem por objetivo contribuir ao acesso universal à cidade, nos termos do seu artigo 2º; e considera como serviço de transporte urbano o de passageiros, sendo coletivo quanto à característica e público quanto à natureza, conforme o artigo 3º, §2º, inciso I ao III; além de considerar os terminais como sendo infraestruturas de mobilidade urbana, de acordo com o artigo 3º, §3º, inciso III (Brasil, 2012). Dessa maneira, essas seriam as bases legais propostas no estudo que interligam o direito ao transporte ao direito à cidade, alinhados à mobilidade urbana. Nesse sentido, para Harvey (2012) o direito à cidade se demonstra como sendo um direito comum a toda a coletividade, em usufruir e ocupar a cidade. Conforme Keblowski, Criekingen e Bassens (2019) é preciso tratar o transporte urbano de maneira a buscar a justiça social sem, contudo, desconsiderar os contextos históricos e culturais das cidades e como eles influenciam o sistema de transporte e o seu acesso. Logo, os terminais uma vez sendo infraestruturas de mobilidade urbana são espaços públicos que possuem potencial para serem lugares agradáveis, em que as pessoas se sintam confortáveis em aguardar pelos seus ônibus, uma vez que o planejamento urbano das cidades precisa se atentar a esses aspectos (Gehl; Svarre, 2018). Nesse contexto, durante a ida a campo, identificou-se, como desafios enfrentados pelos usuários do transporte público coletivo por ônibus no TRG, a ausência de informação visual acerca dos horários de chegada e saída dos ônibus no terminal; o tempo de espera pelos ônibus – os passageiros a depender da linha aguardam, no mínimo, entre 20 a 30 minutos para a partida; a falta de informação sobre quais são as linhas que oferecem o serviço no terminal; a ausência de identificação da linha de ônibus e sua respectiva plataforma; a formação de filas longas associadas à superlotação dos ônibus, linhas como o Icoaraci UFPA, o UFPA Cidade Nova 6, o Curuçambá UFPA e o Tapanã UFPA formam filas extensas que não comportam todos os usuários, fazendo com que o restante da fila precise aguardar por um tempo maior a chegada do próximo ônibus; além do calor em decorrência das altas temperaturas – sobretudo nos meses de pouca chuva em Belém, agravando-se pelos efeitos das mudanças climáticas, tendo em vista que a estrutura do terminal é aberta e não conta com sistema de ar-condicionado, apesar de possuir cobertura para abrigo parcial do sol e da chuva. Somado a isso, o terminal em estudo atende sobretudo os estudantes universitários da Universidade Federal do Pará (UFPA), uma vez que o terminal se localiza em frente à saída do portão 3 da instituição. Em estudo semelhante, Pinheiro e Pontes (2022) demonstraram que o transporte público coletivo por ônibus na cidade de Belém, de maneira geral, atende parcialmente aos seus usuários de maneira precária e deficitária. De acordo com UFPA (2023) havia, no ano de 2022, um total de 25.566 alunos matriculados somente na graduação na cidade de Belém, sem incluir alunos da Pós-Graduação, do Básico, Técnico e Tecnológico distribuídos pelo principal campus da UFPA na cidade, qual seja o campus do Guamá onde se localiza o terminal pesquisado. Não houve diferenças significativas observadas entre a primeira semana e a segunda em campo, com exceção do comprimento das filas registrado ter sido menor na primeira semana em decorrência de ser a última semana do mês de julho na qual se teve redução das atividades na UFPA. Para Kowarick (2012) a chamada “lógica da desordem" estaria relacionada à urbanização desordenada, marcada pela falta de planejamento e pela especulação imobiliária que cria um cenário de desigualdade e precariedade, com áreas desprovidas de infraestrutura e serviços básicos. Essa desordem se manifestaria na ausência de um sistema de transporte público eficiente e acessível, que obriga os usuários a longos deslocamentos diários, consumindo tempo e recursos que poderiam ser dedicados à educação, ao lazer e outras atividades essenciais para o desenvolvimento humano. De acordo com Harvey (2019) o direito à cidade é apresentado como uma reivindicação política e que implica na transformação radical do espaço urbano, garantindo o acesso de todos para os benefícios da vida urbana e o controle democrático sobre o processo de produção do espaço. Desse modo, a aproximação das teorias de Kowarick e Harvey permitem visualizar os processos de exclusão e injustiça presentes na realidade local observada no TRG. Associa-se a isso, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 10 e 11 – redução das desigualdades, cidades e comunidades sustentáveis, respectivamente – da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, em suas metas 10.2 e 11.2, uma vez que até o ano de 2030 se buscará promover a inclusão social e proporcionar o acesso a sistemas de transporte seguros e acessíveis para todos, estando diretamente ligadas à superação dos desafios apontados na presente pesquisa (ONU, 2015). Desse modo, os desafios identificados durante a pesquisa de campo inviabilizam o exercício pleno dos direitos humanos ao transporte e à cidade, associados à mobilidade urbana dos usuários do terminal de ônibus. Sugestiona-se a aplicação da base legal existente, mediante a execução das políticas públicas pela gestão pública, a fim de realizar uma reforma estrutural no TRG com a instalação de monitores informando em tempo real os horários de partida e chegada dos ônibus; placas indicando quais as linhas disponíveis; o aumento da frota das linhas com maior demanda; modificação da estrutura física do terminal aberto para fechado com a instalação de ambiente climatizado adequado.

 

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Publicado

2024-12-12